Até que ponto os media são responsáveis pela dimensão de fenómenos como o regresso de Fátima Felgueiras?
Não é uma pergunta de resposta fácil. O primeiro impulso é dizer que não a dimensão política do caso justifica plenamente a atenção mediática que tem recebido. O problema não é esse. A verdadeira questão está em perguntar se os media conseguem ser mais do que meros retransmissores do espectáculo montado pela autarca. Se fizermos a revisão de alguns episódios televisivos da semana passada, constataremos que as televisões contribuíram para a festa de Fátima, ela própria pensada (e bem) em função do pequeno ecrã. Da libertação no telejornal à conferência de imprensa em directo que, na SIC Notícias, precedeu o debate dedicado a Felgueiras. Quando este começou, um dos candidatos estava fora da mesa e recusava ir ao estúdio, onde apenas se encontrava um dos adversários de Fátima. O pormenor mais interessante era o povo, excitadíssimo porque havia circo. Um comentário em directo de uma felgueirense "Já a vi uma vez, mas não estou satisfeita. Quero vê-la outra vez." Não foi por acaso que Avelino Ferreira Torres se lançou para Amarante a partir da Quinta das Celebridades. Fátima Felgueiras também pertence a este populismo de reality show. Tal como José Castelo Branco, este populismo vive da extravagância, do escândalo e, sobretudo, do ultraje. Fátima Felgueiras não é bem uma salvadora. Essa imagem foi colada e reproduzida nos media por um truque da campanha mediática da regressada. Os cartazes com o refrão de Don't Cry For Me, Argentina eram ostentados pelo povo, que estaria disposto a mostrar o que quer que fosse, desde que as televisões filmassem. O povo de Fátima Felgueiras quer aparecer na televisão. Mas a opinião publicada levou a sério o peronismo Madonna Style e deu-lhe gás, validando a estratégia mediática que consistia em identificar a senhora com Eva Perón. Quem quer ser notícia tem que escandalizar. E nada melhor para o conseguir do que identificar Fátima Felgueiras com uma personagem que simboliza, por excelência, o terceiro-mundismo político.Ao mesmo tempo, no tal debate da SIC Notícias, os adversários de Fátima falam numa enorme crise social no concelho. Também nesse dia, ouvi Carlos Lage dizer o mesmo, na RTPN, sobre o todo da região norte. As notícias que vemos sobre Felgueiras não enfatizam a crise; agarram-se ao espectáculo, que é o que vende, deixam-se conduzir pela tensão do directo. É preciso, de uma vez por todas, que os media tenham a coragem de criar a sua agenda. A alternativa é ir a reboque das agendas dos outros.
Miguel Gaspar
Miguel Gaspar
4 comentários:
Infelizmente, para mim, a política é quase uma imensa fantochada...
A novela politica portuguesa é uma daquelas em que o argumento é muito mau, a producao e os patrocinios pagos pelos contribuintes , e com actores muito feios e muito maus! E o mais trágico é que gentalha desta gere o futuro deste pais. E com especimes desta natureza, que futuro tem a haver o nosso pais?
Abracicos!
Creio que a grande maioria dos bloguistas nacionais postou sobre o mesmo assunto por estes dias (pelo menos, li uma série deles entre os que frequento habitualmente).
Mas este, é sem dúvida o post mais franco e directo que já li a respeito.
Fica no meu top a meias com o post escrito pela Risoleta Pinto Pedro no http://risocordetejo.blogspot.com, que naquele estilo inimitável que a caracteriza, de forma muito concisa e doce e sem dizer quase nada, disse tudo.
Os meus parabéns ao Miguel, pela coragem e pela objectividade.
Miguel:
Já vi que já foi ao Risocordetejo da Risoleta.
Mas olhe que o post a que eu me referia não era aquele onde esteve e comentou, mas o que ela publicou no dia 22 deste mês. ;-)
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